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19 de Abril de 2024

Afastamento e medida cautelar contra parlamentar ferem Constituição, dizem especialistas

Ação foi tirada da gaveta para dar desfecho a caso do tucano, afastado do mandato e cumprindo recolhimento noturno

Publicado por Maysa Martimiano
há 7 anos


O Supremo Tribunal Federal (STF) julgar a partir desta quarta-feira (11) a Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) 5526/2016, que pode definir se o órgão pode afastar ou determinar medidas diversas de prisão a parlamentares sem a confirmação das Casas Legislativas. Retirado providencialmente da gaveta, esse julgamento definirá a situação do senador Aécio Neves (PSDB-MG), que teve seu afastamento e recolhimento domiciliar noturno determinados pela 1a Turma do tribunal em 26 de setembro. A decisão causou uma rebelião em plenário conduzida pelo líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), ele mesmo um recordista de investigações no Supremo e campeão de citações na Operação Lava Jato. A questão divide opiniões.

A reportagem do Congresso em Foco ouviu três advogados criminalistas e constitucionalistas para analisar os cenários das possíveis decisões da Corte. Entre eles houve unanimidade em considerar que, se o Supremo entender constitucional a aplicação de afastamento e penas diversas de prisão contra parlamentares, terá agido em desacordo com a Constituição e abrirá precedentes perigosos.

A ação estava na gaveta do ministro Edson Fachin desde maio do ano passado, quando foi apresentada por três partidos – PP, Solidariedade e PSC – após o afastamento do então presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha (PMDB-RJ) do comando da Casa. O peemedebista teve seu mandato cassado pelos pares quatro meses depois, em setembro de 2016, e foi preso no mês seguinte. A decisão do STF terá repercussão geral para casos futuros, o que interessa aos mais de 230 parlamentares investigados no Supremo.

A Adin questiona se os artigos 312 e 319 do Código de Processo Penal (CPP) estão “em consonância com as regras constitucionais que garantem a autonomia do Poder Legislativo e as prerrogativas dos parlamentares”, prerrogativas que estão dispostas nos parágrafos 2º e do artigo 53 e e do artigo 55 da Constituição. Em resumo, a ação quer saber se é possível declarar prisão preventiva como garantia da ordem pública e econômica e a aplicação de medidas cautelares diversas à de prisão, como afastamento e recolhimento noturno, restrições aplicadas a Aécio.

Em contraponto, dispositivos constitucionais protegem parlamentares dessas medidas ao determinar que “desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão”.

A situação se apresenta como um impasse entre Poderes e a opinião pública. Uma decisão no sentido de que STF pode aplicar tais medidas poderá abrir precedentes considerados perigosos por juristas, enquanto a revisão da decisão do colegiado em favor Aécio poderia ser interpretada como proteção ao senador, resultante de pressão corporativa que visa interesses próprios. Aécio responde a nove inquéritos no Supremo, situação que atinge pelo menos seis em cada dez senadores.

Proteção a Aécio

Questionados sobre a possibilidade de que a Suprema Corte decida no caminho contrário da determinação dos ministros Roberto Barroso, Rosa Weber e Luiz Fux, que formaram maioria na Primeira Turma para afastar Aécio do mandato, os três advogados não consideram a decisão uma proteção a Aécio ou a outros parlamentares, mas sim a garantia do que prevê a Constituição.

Professor de Direito Civil-Eleitoral na Universidade de Brasília (UnB), Bruno Rangel afirma que uma decisão do Supremo de rever a determinação da Primeira Turma não seria uma “proteção” a Aécio, que responde a nove inquéritos no STF. “Entendo que haveria aí um rigor de respeito à Constituição. E aí cabe ao Senado decidir por um possível afastamento, e é possível que haja uma decisão corporativa. Mas aí sim entra a pressão popular como determinante, para constranger os senadores a decidirem pelo afastamento”, argumentou Bruno, que também preside a Comissão de Direito Eleitoral da Ordem dos Advogados do Brasil no Distrito Federal (OAB-DF).

O advogado criminalista João Paulo Boaventura reforça o argumento do colega. Ele afirma que a proteção não seria a parlamentares investigados, mas sim às prerrogativas das Casas Legislativas, de maneira que um poder não interfira no outro. “É a liberdade da Casa, de seu próprio funcionamento. Porque se não daqui a uns dias o Senado e a Câmara vão virar secretaria do Judiciário”, afirmou.

Para Cezar Britto, ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), não se trata de uma questão de impunidade do parlamentar suspeito, mas de não abrir precedente que fortaleça a “juristocracia”. Segundo ele, uma decisão que permita a aplicação dessas medidas deixaria a atividade parlamentar “subordinada a uma decisão liminar de um grupo fracionado”.

Garantia constitucional

Para Boaventura, se o Supremo interpretar que pode aplicar as medidas previstas nos artigos do Código de Processo Penal (CPP), isso equivaleria a colocá-lo acima da Constituição. “Se declararem que o artigo 319 se aplicaria a parlamentares, teríamos a inconstitucionalidade do artigo 53 da Constituição”, afirmou. Para ele, mesmo que haja uma “interpretação forçada dos artigos do CPP, a Constituição é clara”.

A opinião é compartilhada por Britto. “Abre, sim precedente perigoso. Pois transfere para um poder, no caso o Judiciário, o papel de decidir quem pode ou não exercer a atividade parlamentar. Ainda mais em processos ainda não julgados, que ainda estão em formação de juízo.” Para o advogado, isso colocaria o Judiciário acima do Legislativo e quebraria o princípio da independência entre Poderes.

“Má aplicação da lei”

Boaventura avalia que o precedente para afastamento já foi aberto com o ex-senador Delcídio do Amaral, representante do PT do Mato Grosso do Sul afastado e cassado em 2015, depois de flagrado em tramas na Lava Jato para calar o ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró. A mudança agora, comparando-se os casos de Aécio e Delcídio, é apenas a situação política.

Ainda segundo Boaventura, o preocupante seria uma decisão que reitere a interpretação da Primeira Turma. O advogado criminalista diz não considerar precipitado tal entendimento, mas uma má aplicação da lei. “Nós teríamos, pela primeira vez na história, o Supremo declarando inconstitucional um artigo da Constituição”, afirmou, acrescentando que não vê como os ministros interpretariam de outra forma, constitucional ou tecnicamente, já que o “artigo da Constituição é claro”.

Bruno Rangel também diz não ver a decisão da maioria dos ministros da Primeira Turma como precipitada, mas afirma que os magistrados “deram à Constituição uma interpretação mais elástica do que a que pode ser dada”.

FONTE: Congresso em foco

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14 Comentários

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Com todas as vênias do planeta, não concordo com essa visão dos denominados “especialistas”. Só mesmo a declaração de inconstitucionalidade do artigo 319 do Código de Processo Penal conseguirá fazer prosperar suas teses. Isto porque esse artigo estabelece claramente serem as penalidades nele arroladas diversas da prisão. Até hoje ele não foi questionado. Quando, porém, a Polícia Federal bate à porta dos poderosos começa a chiadeira.

A população, por sua vez, não é burra e já percebeu que imunidade não se confunde com impunidade de parlamentares, nem as prerrogativas de que desfrutam devam se por a serviço da imoralidade. continuar lendo

"A população, por sua vez, não é burra e já percebeu que imunidade não se confunde com impunidade de parlamentares, nem as prerrogativas de que desfrutam devam se por a serviço da imoralidade."

Certíssimo. continuar lendo

Enquanto isso processos por todos os lados contra o Bolsonaro por "crime-pensar"... continuar lendo

Exato, eles ferem a constituição todos os dias contra o povo, seja quem for e o cargo que for, se existe indícios de materialidade e autoria, deve ser investigado. Tem provas robustas, afastado e julgado, consequentemente preso. continuar lendo

Isso porque a Constituição, da forma como se apresenta, anda ferindo de morte a dignidade do povo brasileiro. continuar lendo

Concordo, mas temos que tomar cuidado também no quando substitui-la, afinal, Lulia, Aécio e Lula estão dentre os constituintes que assinaram a CF. Qual a probabilidade do trio estar lá de novo para fazer o mesmo, mas agora pior? continuar lendo

Existe justiça no Brasil.
Justiça se chama dinheiro! continuar lendo

Meu caro José Roberto, como você, tenho muitas restrições à nossa Constituição. Entretanto, há nelas coisas muito boas também. Uma delas é o artigo 37, o qual estabelece os princípios que norteiam a Administração Pública. Por conseguinte, tenho um critério para discernir quando uma decisão ou tese se mostra inconstitucional. É quando ela se desvia de qualquer desses princípios.

A tese de que as prerrogativas dos parlamentares se sobrepõem, inclusive, ao princípio da moralidade em minha opinião, já nasce eivada de inconstitucionalidade. O grande constitucionalista J.J. Gomes Canotilho é que me ensinou a pensar assim. Recomenda ele que, na dúvida quanto à aplicação de uma norma constitucional,, consultem-se os princípios. continuar lendo

Não critico a constituição como um todo, Ricardo.
Precisaríamos ter em mãos ferramentas mais eficazes contra o que hoje acontece no Brasil, que é a formação de cartel no governo, com objetivo de apropriação do erário ou perpetuação no poder.
Está clara a formação desse cartel e o que esperamos? A morosidade da justiça? As penalidades e procedimentos previstas pelos próprios bandidos?
É de rir, pra não chorar.
Precisamos urgentemente que todo corrupto perca em definitivo seus direitos políticos e que ao menor sinal de corrupção, seja afastado do cargo e tenha seu passaporte recolhido até o final das investigações.
Sem isso, somos apenas marionetes nas mãos dessa quadrilha. continuar lendo

Correto José Roberto, a Constituição deveria ter dado mais proteção ao erário e menos proteção a bandidos, mas o entendimento dos tais “especialistas” quanto a não caber ao STF aplicar medidas cautelares a parlamentares é, em meu entender, assistemático. A Constituição outorgou ao Supremo competência para julgá-los. Logo, outorgou à Corte jurisdição sobre eles. A única exceção é na hipótese da prisão. Como sabemos, normas excepcionais reclamam interpretação restritiva.

Portanto, a norma de que o Senado deve autorizar a prisão do parlamentar não deve ser estendida às medidas cautelares dela diversas, até porque não faz sentido tenha a Constituição outorgado ao STF uma jurisdição desprovida do poder geral de cautela. continuar lendo

Dinheiro é nome popular para a justiça no Brasil continuar lendo

Complicado, embora seja a vontade íntima de todo brasileiro (inclusive a de alguns Ministros do Supremo, espero), possibilitar o afastamento e aplicação de medidas cautelares, sem passar pela Casa Legislativa iria MANIFESTAMENTE contra o Texto Maior. Embora fosse positiva essa eventual mutação constitucional, isso seria de fato um precedente perigoso para o futuro. continuar lendo

Poderia mostrar onde o texto constitucional impede a aplicação de medidas cautelares a parlamentares.? Adoro aprender. continuar lendo